quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Biblioteca: Rosângela Maluf

Meu amigo B.
Rosângela Maluf

Fico daqui pensando porque você não me quer dar atenção ...
Escrevo e-mails, envio mensagens idiotas, às vezes alguma coisa inteligente, mas você não liga, não dá a menor bola para o que mando ou deixo de mandar. Via Internet tento retomar o que nem bem começamos, um novo papo, novos escritos, perguntas tolas, como é que está o tempo aí, o que você tem feito de bom, tem ido ao cinema? Uma ligação...é isto! Uma telefonadinha! Só para saber, se você está ou não em casa numa hora dessas. Domingo, no horário do chato do Faustão. Ou não? Melhor não!

Ainda ontem o que se passava era exatamente o contrário: minha caixa repleta de e-mails seus, poesias, versos, textos lindos, artigos, dicas de compras, roteiros de viagens, e eu ali, lendo (e gostando). Respirava fundo, fechava os olhos, pensando em você, depois relia tudo, arquivava, lia de novo, mas nem sempre respondia. Às vezes me chegava uma foto. Eu olhava, admirava as mãos brancas, ficava imaginando mil coisas. Se aquelas mãos fumavam, contavam dinheiro, acariciavam ou agrediam, escreviam, tocariam algum instrumento, talvez pintassem telas cheias de sol e de flores...Um sorriso, o que haveria por trás daquele sorriso tão monalisa? Na verdade nem era assim tão misterioso mas me despertava muita curiosidade. O proibido, o oculto, o desconhecido talvez. Telefonar eu não telefonava, vozes trazem perigo...sempre! E se fosse a voz do Neil Diamond cantando no Jonathan Livingston Seagull? Aquela voz que me fez chorar quando fui ver o Fernão Capelo Gaivota. Ah, a voz do Neil Diamand ...Glory, glory, day...era um filme tão lindo que eu poderia contá-lo inteirinho para você, poderia até cantar alguns trechos. Escanear fotos de cenas do filme...Ai, que horror, cantar e contar um filme tão antigo. Aí é que você não apareceria mesmo, nunca mais!

Meu caro amigo B...Bernardo? Benito? Bruno? Bento ? Ah, Bento não...não gosto do nome, me faz pensar em professor de matemática, daqueles de pince-nez e olhar por cima das lentes. Da rua vem um Djavan berrando num carro com o som mais distorcido que já ouvi. Não combina mesmo! Djavan tem que ser ouvido baixinho, apreciado, saboreado. E eu aqui, verificando a minha caixa postal. Nenhuma resposta ao cartão bem humorado que lhe enviei. Sabe de uma coisa? Em outra época já teria chutado você para escanteio mas hoje, aos 40 anos de idade penso que não custa insistir um pouco mais, dar uma pequena chance à sorte. Quem sabe? Tudo é possível e eu não me esqueço, uma noite sequer, de rezar para São Judas Tadeu. E tem mais, acendo vela...vela e incenso "spiritual guide", para que os bons fluidos embalem meu sono.

Mas ando com insônia, sabe...A vida não anda fácil para ninguém. Minhas amigas dizem a mesma coisa. Daí, se arrumar um homem já está difícil o que dirá de se arrumar um daqueles de boa situação, sem filhos, se possível; viúvo (por medida de segurança) e disponível para uma solteirona como eu ? A idade do lobo...nessa altura da vida todos só querem comer chapeuzinhos vermelhos...Sobra mesmo pouca chance para nós. Mas, sabe que olhando no espelho me dou uma idade bem menor? Uns dez anos menos. Talvez porque sou miúda, dizem que mulher grande envelhece mais. Muito osso, muita carne, faz muita vista. As menorzinhas, não, ficam ali, aquela coisinha, murchando aos poucos, sem assustar.

Continua...

A Marquesa Rosângela Maluf é presença certa e constante no Castelo todas as quarta-feiras com seus belíssimos contos. Mais sobre a talentosa prima é só entrar em http://romaluf.blogspot.com.

João Lenjob
twitter: @lenjob
http://lenjob.blogspot.com

O TEXTO ACIMA É DE RESPONSABILIDADE DA COLABORADORA ROSÂNGELA MALUF

Um comentário:

  1. Amei, espero contínuo... Essa idade do lobo, talvez seja por isso o sumiço? Uma coisa é certa, quando o homem desaparece, está fugindo da intimidade ou correndo atrás de outra, o que dá na mesma...irá cair na idade da loba!

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