Numa Mesma Noite
Mariana Coutinho
Você tinha se tornado alguém que eu via passar de longe e não reconhecia mais. Eu já não sentia você. Não sabia você. Não percebia você. Meus olhos te procuravam, retornavam, guardavam, mas sempre a partir daquela foto antiga que não era mais o que é você agora. Três anos te guardaram de mim. Em mim. E agora eu estou aqui sentada nesta mesa olhando para os seus olhos enquanto suas mãos escorregam neste copo esfumaçado de bebida gelada e eu não consigo dizer tudo o que eu penso. Suas pernas trêmulas entregam o seu estado e você insiste em dizer que é natural. São três horas da manhã e eu te escuto falar de outros amores, paquera, sexo, trabalho, religião, viagem, cidade, saudade. Eu também continuo insistindo em mostrar o que eu acredito. Você com este único cigarro na mão esquerda, saiu daquela fotografia antiga e deslizou para o meu presente. Eu continuo insistindo em outros amores, te conto sobre todos eles e você com esse sorriso sem graça de quem não pode mais regular o tamanho da minha roupa, sequer me olha nos olhos. Eu, daqui, querendo que você me olhe inteira; olho para o meu copo vazio para que você consiga desviar o olhar até a mim sem que eu te assuste. Você não me deixa perceber. Eu preciso te redescobrir. Arriscar. Entender o que você quer. Eu sonho contigo enquanto você me liga milhares de vezes numa mesma noite. É por isso que estou aqui sentada nesta mesa com você. Não fui eu que insisti. Foi você que me chamou. Esqueço de tudo. Do seu último namoro. Das minhas viagens. Dos três anos que nos separaram. Os dois copos agora vazios em cima da mesa antecedem uma decisão. Vou embora com você.
Mariana, talentosa e versátil atriz, artista mineira, que já esteve presente aqui com Entrevista conduzindo o Cetro voltou com este belo texto acima e esperamos muito mais dela aqui. Mais sobre ela e de seu trabalho em seu blog Mariana Coutinho e em Entre Encontros.
Castelo do Poeta
twitter: @castelodopoeta
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