sexta-feira, 30 de março de 2012

Biblioteca: Enedina Bentes

Quadro para profissionais da Cultura Brasileira com perguntas fixas elaboradas por João Lenjob inspirado no Livro Entrevistas de Clarice Lispector. Outros Profissionais com o Cetro.



Enedina Bentes, Amazonense, Balzaquiana, Industriaria, Escritora, Agitadora Cultural


Você critica seus próprios trabalhos? 
Muito, contudo não sou carrasco comigo mesma. Me disseram que eu tinha que ser a minha primeira crítica, mas não deixo de ser também a minha primeira fã, por que tudo o que escrevo seja em verso ou prosa, vem sempre com muito amor e muita entrega pessoal. Sempre que acabo de escrever, leio ou declamo para mim mesma em voz alta e quando acho que ficou bom digo: “Caramba!!!!” Mas se não reajo assim... Daí já sei que não ficou bom, sei que posso melhorar e então recomeço. Não sou de amassar e jogar fora, sou de reler, ver onde me perdi de mim mesma e da ideia, e consertar. Confesso que até pra responder a essa entrevista eu li e reli muitas vezes minhas respostas (risos).

O que é o amor? 
Primeira palavra que vem à mente: Deus. Pelo conjunto da obra, por sua criação do universo com todos os seus mistérios, pelo esclarecimento e salvação através de Jesus e sua entrega via morte de cruz por amor a nós, meros pecadores pequeninos e mortais. Por todas as chances que temos de melhorar a cada novo dia, pela emoção que senti quando vi o rosto de meus filhos pela primeira vez e pela vida que é bonita, é bonita e é bonita. Deus é Amor. Eu também acho que se você ama alguém você tem que falar para a pessoa. Gente mal resolvida, sem atitude, que evita se envolver a fundo, mergulhar de cabeça e se entregar me dá agonia. Acho lindo casais que transbordam amor e gestos de carinho. Famílias que fazem 
as refeições à mesa e conversam sobre seu dia. Visitar uma pessoa doente e confortar-lhe. Puxa... tem tantas formas de amar. Você só precisa manter a mente aberta e viver os seus amores sem medidas ou reservas.

As conquistas interferem na vida pessoal? 
Sim, sempre fui assim. A cada novo sucesso alcançado mais alegria de viver, mais me sinto animada e segura, por tabela, acabo contagiando as pessoas ao meu redor. Mas não sou Pollyana e confesso que as perdas e fracassos também interferem, afinal eu sempre fui muito sentimental, haja ombro de amigos para minhas indignações. Entretanto evito alimentar pessimismo, negativismo, rancores. Tudo isso que faz mal pra alma. Fico nessa busca diária pelo equilíbrio e pela paz interior. Tudo que passou serviu de lição. Nada é por acaso.

Qual o maior momento da carreira? 
São tantos momentos especiais, mas vou citar dois que muito me emocionaram: quando ganhei aos 18 anos o prêmio de “Melhor Roteiro” no Festival FUCAPI de Cinema e em 2010 quando me apresentei para minha maior platéia, no Largo São Sebastião, em Manaus na frente do Teatro Amazonas, declamando o texto “Meu primeiro poeta” da Maria Mariana, no show do cantor Manoel Passos em homenagem a Vinícius de Moraes. Todos os assentos ocupados e mais uma multidão em pé. Este último inclusive está disponível para visualização no Youtube e você acredita que até hoje as pessoas me escrevem para cumprimentar sobre esse show? Me trouxe muito carinho e novos amigos de modo surpreendente. É por isso que eu amo tanto estar no palco: a gente não tem a real noção do que causa no coração das pessoas e nem dos frutos dessa semeadura. De algum modo o artista tem esse dom de tocar na alma do público. E isso é lindo! Minha amiga também escritora e poeta, Ana Zélia, me ensinou que quando você sobe ao palco você cresce e as pessoas te respeitam por estar ali. Então é seu dever fazer o melhor que puder, não ter medida para se expressar e brilhar. As pessoas saíram de casa para ver você, então faça valer a pena.

Quando você sabe que vai dar certo algum trabalho? 
Só depois que finalizo, quando escuto os aplausos, o riso da platéia ou quando vejo a 
expressão do leitor. Ás vezes recebo contato via e-mail ou redes sociais de alguém que leu um texto meu e se identificou. Outro dia um poeta chegou pra mim e disse que tinha lido uns poemas meus na internet e que não imaginava que eu escrevesse daquele jeito, que quem me vê não imagina o estilo que tenho. Fiquei feliz. Isso é legal, sabe? Você constata que está crescendo, amadurecendo a escrita e se transformando em quem você almeja ser. Embora haja aqueles abutres que tentam deixar você insegura, mas no fundo do coração você sabe que precisa continuar, acreditar, ter fé. Eu optei por ouvir a voz dentro de mim e dar “mute” nos abutres (risos).

Como você acha que o Castelo pode ser exemplar ou inspirador através da sua pessoa? 
O Castelo é um lar para mim. Aqui são acolhidos artistas de várias classes e estilos, idades e naturalidades. Cheguei aqui desde que o Castelo nasceu há mais de um ano, por que a mãe do Lenjob é minha amiga pessoal e me falava muito de seu filho artista. Eu sempre quis trabalhar com o João. No Castelo a parceria se firmou. Aqui podemos ser quem somos sem frescuras. Somos tratados como nobres com imenso respeito e generosidade. Ao contrário de alguns “grupos” que são indelicadamente fechados e limitados, aqui no Castelo todos somos elevados à máxima potência. Eu vejo pessoas que experimentam um pequeno sucesso e caem na tola ilusão de que são “seres superiores” e que podem ditar quem pode 
e quem não pode ter sucesso também. Eu, nos meus 33 anos de vida, aprendi que cada um tem uma história diferente, experiências diferentes, inspirações e influências diferentes. E se todo mundo escrevesse sobre o mesmo tema e com a mesma mão tudo seria entediante e monótono, não é? Não quero ser espelho de ninguém. Quero ser eu mesma. Se eu não escrevo só sobre o rio, a mata, os cipós e as árvores, não significa que eu seja uma artista menos amazonense ou amazônica, só que as minhas inspirações vêm do mundo todo e não só do meio da floresta em que vivemos. Eu sou mulher, esposa, mãe, filha, neta, irmã... sou a industriaria-formiguinha e a poetisa-cigarra. Tudo isso numa só pessoa. E isso no Castelo é completamente entendido e valorizado. Levando a minha poesia para o máximo de pessoas possível o Castelo do Poeta assume um papel importantíssimo e fico grata por fazer parte desse movimento.

O seu trabalho é a coisa mais importante de sua vida? 
Sim. Escrever sempre foi uma necessidade, uma dor e um prazer ao mesmo tempo. A arte em si é um combustível altamente renovável e eu sei que estou fazendo um bom trabalho quando vejo meu filho lendo livros da Ana Peixoto ou do Elson Farias e declamando “Ou isto ou aquilo” de Cecília Meirelles ou minha filha entra na cozinha cantando Djavan, Maria Gadú ou Eliana Printes. Aí eu vejo que nada é em vão. Já é um legado.

O que você mais deseja atualmente? 
Ver meu trabalho ser levado a sério e reconhecido com o devido respeito que todo artista merece por exercer o seu ofício com amor e dedicação. Isso é o mínimo que o trabalhador de qualquer área exige. Sonho em publicar meus livros (já estou finalizando o segundo) e poder ser lida e compreendida, ou não, mas que o leitor se identifique com aqueles personagens, situações, emoções, que ria, que pense, que reflita e que isso lhe sirva como bem queira. Costumo dizer que não tenho a intenção de nada além de entrar no coração do leitor, e ficar ali pra sempre. Isso é pedir muito (risos)?

Como as pessoas podem interferir no seu trabalho? 
Nossa! De muitas formas! Existem pessoas com as quais eu convivi e que até hoje são inspiradoras e outras que não conheci pessoalmente mas me sinto inexplicavelmente íntima, como se tivesse. “Converso” com elas e sinto sua influência em meu modo de viver e ver mundo. Posso escrever um poema inteiro após ouvir uma frase de alguém, ver um olhar triste, uma gargalhada, se alguém me magoa eu escrevo, se uma cena de novela me emociona eu escrevo, se tenho um sonho bonito eu crio em cima dele, se vejo uma foto antiga recrio aquele ambiente e aquelas pessoas e tudo vira poesia. E naturalmente que as minhas próprias vivências transformam-se em versos vivos, testemunho, depoimento, desabafo. O que me deixa tocada ou indignada me inspira. Meus versos podem ser um buquê ou uma granada depende de quem pegar (risos).

Quais os profissionais da arte, moda, esportes, educação, saúde e afins você mais admira pela natureza profissional e pessoal? 
Puxa essa lista é grande e... ma-ra-vi-lho-sa!!! Essas pessoas praticamente “me acompanham” em influências diárias. Venha e viaje comigo: José Saramago, Florbela Espanca, Cora Coralina, Princesa Diana, Santa Maria Mazzarelo, Pablo Neruda, Violeta Branca Menescal, Cazuza, Renato Russo, Nat King Cole, Mamonas Assassinas, Freddie Mercury, Santa Catarina Labouré, João Cabral de Melo Neto, Michael Jackson, Ayrton Senna, Patrick Swayze, Patsy Cline, Cassia Eller, Maysa, Elvis Presley, Ray Charles... São pessoas que acreditaram em si mesmas, mesmo quando alguém disse que eles não seriam capazes, mesmo que o tempo e as dificuldades lhes fossem adversos. Daí você me pergunta: “Só  artistas que já morreram?” Não. Tem artistas vivos que eu amo também. São super inspiradores para mim. Pessoas especiais como Paulo Gustavo, Michel Melamed, Gessier Quirino, Chico Pedrosa, Marcelo Jeneci, Marisa Monte, Tulipa Ruiz, Pepeu Gomes, Arnaldo Antunes, Toni Garrido, Marcelo Camelo, Jayme Monjardim, Luis Fernando Carvalho, Manoel Carlos, Glória Perez, Ingra Liberato, Fernanda Montenegro, Regina Casé, todos do programa Pânico na TV, a divina Meryl Streep, a turma do Black Eyed Peas, Green Day, Jewel, Silverchair, David Ghetta, Luís Fernando Veríssimo, Leonardo Di Caprio, entre tantos outros são artistas que me inspiram, influenciam e estão escrevendo sua história nas esferas artísticas do meu tempo. A gente escuta certos intelectuais falando que nós temos que conhecer os grandes mestres do passado, e eu não discordo, mas não me peça para escrever como quem viveu nos séculos 16, 17 por que os temas, questionamentos, as experiências e os dilemas são diferentes. Eu sou uma escritora e poeta do meu tempo, registrando a vida das pessoas que eu acompanho e testemunhando através dos meus textos os acontecimentos do presente. A poesia não tem que ser algo elitizado e inatingível. Pra quem tem sensibilidade e amor à arte, a poesia está em todo lugar. Aqui em Manaus tem artistas que eu admiro demais como a poeta Ana Zélia, os professores Francisca Lourdes Louro, Sérgio Freire e Ecila Mabeline, o cantor Manoel Passos, as Bandas Essence e FreeSom, os cantores Cileno e Nicolas Jr., o humorista Márcio Braga, o escritor Milton Hatoum, a Cia de Teatro Metamorphose e sua grande diretora Socorro Carvalho, o poeta e diretor Dori Carvalho, a minha tia Jessilda Furtado que é a Diretora do Teatro Amazonas e é uma das pessoas mais determinadas que conheço, a multitalentosa Sky Rodriques que comanda o programa “Mesa de Bar” de música popular brasileira, que tem a maior longevidade do Brasil, no ar ininterruptamente há quase 23 anos, o poeta Thiago de Mello que onde nos encontramos sempre é extremamente atencioso e acolhedor, enfim devo estar esquecendo nomes, ah sim claro, o Dr. Wilson Gonzaga (um querido!), a transcendental Lilia Barros, o poeta Everaldo Nascimento com seu magnífico trabalho a frente da “Folha do Poeta” são pessoas do cenário local que acreditam na minha arte, me incentivam, me enxergam e respeitam do jeito que eu sou. Não tem essa de que “santo de casa não faz milagre”. Com todos esses profissionais de Manaus aqui citados eu já fiz contato e tive retornos extraordinários de modo que minha admiração só cresceu. Assim sigo meu caminho, recebendo o que cada um tem para me dar e dando o meu melhor para cada pessoa que nele atravessa. Nem sempre compreendida, nem sempre compreendendo mas sem dúvida, estou no caminho certo para descobrir quem eu realmente sou. E quem poderá dizer no que esta história vai dar? As possibilidades são infinitas!

Indicada pela mãe do JoãoLenjob, Enedina foi a primeira representante do Norte do Brasil a ilustrar o Castelo com seus versos e hoje volta para que todos a conheçam mais. Ela sempre estápor aqui. Mais de seu trabalho em seu Blog.

Castelo do Poeta
twitter: @castelodopoeta

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